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Cabo Valério, deu sua vida para nos lib
Ontem 24 de junho de 1997 fez 16 anos em que nós militares "praças" da PM e do BM cansados de sermos massacrados por nossos superiores "oficiais", cansados de recebermos um salário de fome que mal dava para comprar o que comer e alimentar os nossos filhos, cansados de sermos tratados com insignificância por aqueles que conduziam nossas corporações, nos rebelamos contra o sistema. Até para casarmos tínhamos que pedir permissão aos nossos comandantes, se estivéssemos dentro de um ônibus sentados e acompanhado de nossas esposas e entrasse um superior hierárquico, tínhamos que levantar e dar o lugar ao mesmo. Nós praças só tínhamos o direito de não ter nenhum direito. No ano de 1997 o então comandante geral da PMMG se reúne com o então governador e hoje senador Eduardo Azeredo e sorrateiramente pede um aumento salarial apenas para os oficiais, ao ser questionado pelo governador como ficaria "as praças", a resposta veio na ponta da língua, "as praças os comandantes dos batalhões seguram". Foi uma demonstração de covardia e ignorância por parte do Cmdo da época e uma falta de insensibilidade do governo por aceitar o pedido. Essa traição do então comandante geral e do governador foi o estopim da revolta das "praças" e em 13 de junho de 1997 iniciou-se um levante dentro do Batalhão de Choq mas foi contido com o gigante ficando adormecido, apenas adormecido, pois em 24 de junho de 1997 o vulcão entrou em erupção e de novo o glorioso Batalhão de Choque inicia uma revolta, escolhem um líder "cabo Julio", logo após aparece outro líder "sargento Rodrigues", e a revolta se espalha por toda as Minas Gerais. É formado um grupo de negociação para exigir do governo que o aumento fosse estendido também a nós praças e não apenas aos oficiais. Grupo de negociação: Cabo Julio (líder principal), Sgt Rodrigues, Sub Ten Gonzaga, Cabo Maurício (Maurição) e outros. Mas as negociações não avançavam pela intransigência do governo e pela traição dos oficiais que faziam um "grupo fechado" para a negociação. Devido a isso iniciou-se uma passeata pelas ruas de BH e grande BH em direção a praça da liberdade, nos reunimos no então Clube dos Cabos e Soldados e hoje Centro Social dos Cabos e Soldados, chegavam ônibus cheios de militares vindos de todo o estado de MG. Cabo Julio recebe um telefonema de ameaça em seu celular quando estava no palanque conversando com nós manifestantes, alguém lhe fornece um colete a prova de bala. Nesse momento um oficial superior Cel Bahia tenta entrar nos portões do Clube dos Cabos e Soldados sobre o pretexto de nos apoiar, é colocado para fora aos gritos de "você é um traidor", "pediram aumento só para vocês e para nós não", "nenhum comandante de batalhão irá nos segurar". As lideranças principais que a essa altura não era só o cabo Julio, nos pediram para tirarmos as armas do coldre e colocássemos na cintura e que em nenhum momento da nossa caminhada pelas ruas sacássemos as mesmas, aquele que não cumprisse as determinações das lideranças e promovessem qualquer tipo de baderna, era para ser seguro por nós e entregue a alguma guarnição policial. Iniciamos a passeata pela avenida Amazonas, passamos pelo Instituto de Investigações onde vários policiais civis se juntaram a nós, fizemos a primeira parada no Pirulito da Praça 7, seguimos pela avenida Afonso Pena em direção a Praça da Liberdade, ao chegarmos próximo ao nosso objetivo que seria o Palácio do Governo, encontramos um desastroso cordão de isolamento em frente ao QCG, composto em sua maioria por cadetes femininas, não queriam nos deixar chegar até o Palácio do Governo, foi ai a gota d'água, quem estava na frente começou subir as escadas do QCG e outro grupo tentaram ultrapassar o cordão de isolamento. |
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Cabo Julio acima, Sd Wedson (acusado injustamente de
haver dado o tiro que atingiu o Cb Valério, mais abaixo o Cb Valério
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INÍCIO DOS TIROS
Havia na entrada do QCG um segundo cordão de isolamento composto por oficiais, cadetes e militares trazidos do interior do estado, dentro do prédio havia oficiais fortemente armados e com ordens expressas para no caso de invasão atirarem (as balas não eram de festim mas verdadeiras). Em cima do QCG havia atiradores de elite encapuzados da PM, em cima do Palácio do Governo mais atiradores de eleite encapuzados. Cabo Julio, Sargento Rodrigues, Cabo Valério e outros militares se posicionaram na mureta ao lado das escadas que da acesso a entrada do QCG pedindo aos manifestantes calma e que não invadisse o QCG pois se isso acontecesse, fatalmente haveria uma carnificina, nesse meio tempo houve-se um primeiro disparo que veio dos atiradores de elite que estavam no topo do QCG, logo após outro tiro e mais outro que partiram do meio dos manifestantes, após um outro tiro "dado para o alto" que partiu da arma do Sd Wedson que estava logo a minha frente, esse tiro possivelmente foi o que acertou a janela do segundo andar do prédio estilhaçando-a.
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Cabo Valério atingido por bala |
Logo após dois tiros simultâneos, um dos tiros foi dado pelo Cel Eleotério que trocou de arma com um cadete e fugiu pela lateral esquerda do prédio, entrou numa viatura da Rotam tomando rumo ignorado, pouco tempo depois retornou ao QCG entregando a arma a um promotor de justiça. Logo após os dois últimos disparos, houve uma gritaria e correria pois naquele momento um dos dois disparos atingiu a cabeça do cabo Valério, entrando por um lado e saindo pelo outro deixando claro que a bala era de grosso calibre, cabo Valério foi levado as pressas e internado no Pronto Socorro João XXIII, vindo a falecer dias após.
Logo após o cabo Valério ter sido atingido, houve uma reunião entre os principais lideres dos manifestantes com elementos do governo, onde depois de muita discussão e naquele mesmo dia as partes entraram num acordo e o aumento foi dado tanto para os oficiais quanto a nós praças.
Por causa dessa revolta das praças da PM e BM, alguns militares (todos praças) receberam como punição detenção diversas e 182 foram expulsos, dentre eles eu e meu filho.
Segue abaixo a relação de todos os militares expulsos com a graduação da época, também várias fotos do percurso do movimento.
Relação dos ex-PMs com graduação da época, participantes do “Movimento Reivindicatório da PMMG E CBMMG em 1997”, que foram excluídos e posteriormente anistiados, através de um acordo entre os lideres principais do movimento com o candidato favorito a governador Itamar Franco, logo após reintegrados ao CBMMG. De acordo com o Decreto nº 40.400 de 04 de junho de 1999, publicado no Minas Gerais nº 89 em 05 de junho de 1999.