Proibidas pelo Código de Posturas, guaritas e cancelas são cada vez mais usadas por moradores de bairros de BH com alto poder aquisitivo para tentar barrar criminosos
Mateus ParreirasNuma busca desenfreada por segurança, moradores de bairros mais ricos de Belo Horizonte, nas regiões da Pampulha e Centro-Sul, avançaram sobre os passeios e vias públicas com guaritas de segurança privada, cancelas e muros, como se fossem área particular. O Estado de Minas mostrou na edição de ontem que a necessidade de se proteger de assaltos, furtos e sequestros relâmpagos está aumentando a procura pelo Olho Vivo, sistema de vigilância com câmeras nas ruas operado pela Polícia Militar, enquanto regiões com maior índice de criminalidade, mas de recursos escassos, continuam sem os aparatos eletrônicos.
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) deveria coibir as instalações de guaritas, pois elas ferem seu Código de Posturas, mas a administração municipal não soube informar ontem, por meio da Secretaria de Regulação Urbana ou da Procuradoria do Município, se os aparatos de segurança privada são ilegais. Enquanto isso, as cabines se alastram. Em 2007, quando defendia a instalação de guaritas de segurança privada, o deputado estadual Fred Costa (PHS) contou 600 unidades espalhadas pela cidade. De acordo com fontes da Polícia Militar, esse número cresceu mais de 50% desde então, chegando a quase mil unidades sobre os passeios. “A sociedade tem o direito de providenciar a própria segurança, quando o estado não a provém”, defende o parlamentar.
De acordo com o comandante do Policiamento da Capital, coronel José Geraldo Azevedo, a atividade dos vigilantes é perigosa. “Os homens que trabalham nas guaritas não são regulamentados nem treinados. Quem garante que não informam aos bandidos sobre a movimentação nas casas. Além do mais, já houve registros de máfias de segurança que provocavam crimes em áreas não vigiadas pelas guaritas, para que as empresas pudessem instalar esse serviço lá”, afirma o militar.
Situações assim podem ser percebidas na Pampulha. No Bairro São Luiz, a Alameda dos Jacarandás é uma ilha de tranquilidade. Pelo menos no trecho de 200 metros onde 10 moradores pagam por uma guarita . “Aqui não tivemos problemas depois que instalaram a guarita. Houve uma época que a prefeitura cogitou removê-las, mas a PM não consegue nos dar segurança. Prefiro tirar do nosso próprio bolso e ter sossego. Aqui em volta a gente só ouve falar de sequestros relâmpago e roubo de bolsas”, diz a dona de casa Cristina Santos, de 45 anos, que fornece energia para a guarita.
Um pouco mais abaixo na rua, a também dona de casa Sandra Camarota, de 54, lembra que a cunhada, que mora na casa ao lado, chegou a ter a casa assaltada e se mudou, quando a guarita não existia, há quatro anos.
Cerco a suspeitos O vigia Daniel Magno, de 33, nem parece preocupado com os casos crescentes de assaltos em volta da rua. Passa os dias tranquilo, sentado num banquinho lendo revistas dentro da guarita de fibra de vidro, onde tem filtro d’água, televisão, rádio e até banheiro. “Se vejo um suspeito, tento me aproximar, perguntar se precisa de informação, mas nunca precisou”, disse.
Fora dali, as histórias de assaltos proliferam. Na mesma rua, além dos 200 metros protegidos, a aposentada Dalva Maria de Jesus, de 70 anos, diz ter vivido o pior momento da vida dela. “Três homens e uma mulher chegaram me pedindo informações e me dominaram com revólveres na mão. Levei-os ao escritório, pedi para o advogado R$ 5 mil e entreguei a eles. Me abandonaram numa favela. A região está muito perigosa”, disse.
Pouco mais à frente, perto do colégio particular Santa Marcelina, os assaltos se tornaram frequentes. “Deixo e busco minha neta na escola, mas morro de medo de assaltos. Ontem (quarta-feira), uma senhora que passou de carro foi abordada por motoqueiros que rasgaram a roupa dela para levar a bolsa”, conta a dona de casa Vera Lúcia Passos Gomes Araújo, 55 anos.
Numa outra rua da Pampulha, uma cancela que existe há 17 anos intimida a entrada de carros para manobrar ou até a meninada que tenta andar de bicicleta ou skate por lá. Além da cancela, há um quebra-molas e uma pintura de “Pare” nos dois sentidos. A guarita, que tem monitoramento de câmeras, água, banheiro e celular, aciona luzes e fecha a cancela a partir das 18h. A situação ficou assim há tanto tempo, que os desmandos só aumentaram. Cada morador começou a se apropriar da calçada. Um ergueu um muro no meio dela e outro colocou um cavalete no passeio para impedir que carros manobrem ali e quebrem seu piso de pedras São Tomé, de R$ 90 a unidade.
De acordo com o comandante da PM na capital, a corporação já tem monitorados os pontos onde estão as guaritas e fará uma ação conjunta com a Polícia Civil e a prefeitura. “Eles estão incorrendo em crime de usurpação de função pública, por policiarem as ruas, numa função que é nossa. A prefeitura vai remover as cabines devido ao Código de Posturas, que as proíbe”, disse o coronel Azevedo. A PM informou que vai aumentar o policiamento no Colégio Santa Marcelina.
Entenda o caso
Guaritas e cancelas nas ruas: Na votação do Código de Posturas, em 2009, a proibição específica da instalação de guaritas sobre as calçadas de Belo Horizonte foi retirada da votação na Câmara Municipal. A medida abriria caminho para que os equipamentos de segurança privada pudessem ser usados.
Naquele mesmo ano, entretanto, quando a Câmara Municipal votou a regulamentação das guaritas, seu padrão construtivo, os locais específicos onde podem ser usadas e como o serviço deveria ser prestado, essa questão foi derrotada.
Hoje, apenas pontos de ônibus e táxis podem ter guaritas instaladas em passeios, observando uma distância mínima e corredor de passagem de pedestres. Cancelas e muros sobre os passeios ainda são vedados pelo artigo 17 do Código de Posturas.
Fonte: Câmara Municipal
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